Posted: quarta-feira, 13 de janeiro de 2010 by O Blog dos Poetas Vivos in Marcadores:
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Em “Orientalismo”, Said defende a tese que o Oriente é uma criação do Ocidente, promovendo de “Orientalismo” como forma de discurso resultante da elaboração ocidental, que criou dentro de seu sistema acadêmico e intelectual uma espécie de categoria e um tipo de erudito especifico – o Orientalista. Na realidade o que está em jogo é essencialmente uma relação de poder na qual o discurso orientalista constrói e legitima a situação entre dominantes e dominados. Para Said, falar de Orientalismo é a princípio falar de uma empresa Cultural Francesa e Britânica e que, após a Segunda Guerra Mundial, tornou-se uma empreitada norte-americana. Desta forma o Ocidente, ao construir a imagem de um Oriente inferior, pobre e autoritário, simultaneamente estava construindo sua auto-imagem de superioridade, riqueza, democracia. A manipulação e veiculação dessas idéias gerou conseqüências desastrosas para a humanidade.Como exemplo, o autor aponta a questão da dominação americana no Oriente, e descreve a pretensão ocidental desde Napoleão no século XVIII, de mudar o mapa do Oriente Médio.

Ocorre também que o mundo academico acabou tomando para si a responsabilidade de formular teses e doutrinas em relação ao Oriente e ao “povo do Leste”, sobre sua língua, sua história, sua política e até sobre sua mentalidade. Partindo do projeto de Oriente como um objeto de estudo dos acadêmicos ocidentais, foi criado um discurso com viés erudito e imaginativo por meio de pesquisas e literatura, que é comercializado até hoje. Nesse sentido indivíduos de várias áreas do conhecimento como escritores, filósofos, teóricos políticos, economistas, administradores imperiais, tem aceitado a distinção básica entre Leste e Oeste como ponto de partida para seus discursos.

Com o término da guerra de 1973 o árabe passou a ter mais destaque entre as figuras do mundo oriental, porém de forma negativa, como alguém que pode prejudicar o mundo desenvolvido. Deste modo o árabe é visto como ameaçador.Para compor este mito em torno dos árabes e mulçumanos os intelectuais orientalistas contribuíram significativamente. Muitos dogmas foram gerados pela academia ocidental ao tratar dos árabes e islâmicos; o principal está na oposição sistemática – pode-se dizer maniqueísta - entre Oriente e Ocidente: o primeiro é o lugar do desenvolvimento, do humanismo, da racionalidade, e o outro é um espaço inferior, bárbaro, incivilizado. Assim, o interesse e a preocupação americana com o Oriente – e, todavia, o incentivo às pesquisas e publicações - surgiu com a necessidade de compreender aquele povo que significava uma ameaça à hegemonia ocidental.

É justamente a construção deste discurso e suas conseqüências que Said se propõe a problematizar. Para o autor, através do orientalismo o Ocidente criou um saber, produziu um oriente político, sociológico, ideológico e ainda, criou um discurso científico para legitimar sua autoridade, ou seja, são visões e versões criadas por uma civilização para inventar a outra - processo que se iniciou a partir do período pós-Iluminista. Pode-se perceber a persistência desse discurso dominador moldado pelo Orientalismo através da persistente distribuição de consciência geopolítica nos textos estéticos, sociológicos, históricos e filosóficos. O Orientalismo se manteve através de um intercâmbio dinâmico entre autores e os grandes interesses políticos moldados pelos três grandes impérios. Um exemplo disso é que autores como Lewis e do Huntington defendem idéias semelhantes, como a supremacia dos Estados Unidos - representante do Ocidente - em relação ao Oriente; e com esta concepção reiteram o conflito entre “raças” com teses do tipo “choque das civilizações”.

Said critica estas teorias dizendo que “um dos grandes progressos na moderna teoria cultural é a percepção, quase universalmente reconhecida, de que as culturas são hibridas e heterogêneas” (p. 460). No mais, nos afirma é que o “Orientalismo” não foi escrito para ser um livro “antiocidental”, entretanto, diante de um contexto tão turbulento e tenso entre dicotomias de Ocidente e Oriente -nós e eles- muitos o interpretaram como tomando partido a favor dos orientais oprimidos. Admite, com pesar, que embora o seu livro tenha chegado a vários lugares no mundo e tenha cumprido um papel importante de impulsionar a discussão, não houve mudanças significativas na compreensão norte-americana - apesar de na Europa a situação ter melhorado um pouco. Said argumenta ironicamente que “[...] se o Iraque fosse o maior exportador mundial de bananas ou laranjas, sem dúvida não teria havido Guerra nem histeria em torno de armas de destruição em massa misteriosamente desaparecidos [...]”. Essa citação é ilustrativa para compreender como o autor percebe o interesse dos EUA, criticando a falsa intenção de levar a paz ao mundo, que na verdade esta intimamente relacionada com as necessidades de sua político-econômica. Oi seja, ao se acentuar a bipolaridade Oriente Ocidente, o que está em jogo nada mais é do que uma fria relação de poder e dominação.

Por fim, o que de fato o autor pretendia com a obra era “libertar os intelectuais dos grilhões de sistemas como o Orientalismo” (p. 450), defendendo a noção do Oriente como local autonomo e que, portanto, deve ser respeitado dentro de sua própria lógica, não podendo então, ser julgado de acordo com a dinâmica da sociedade ocidental.